O decreto para uso da BIM (Building Information Modeling ou Modelagem de Informação da Construção) na gestão pública brasileira é muito recente. A maioria dos órgãos já está se adequando a esta realidade, entretanto a tecnologia ainda não está sendo usada em sua plenitude. É preciso considerar que sua aplicação é muito ampla, podendo ser utilizada nas diversas fases do empreendimento: concepção, construção, operação e manutenção. Diante disso, é natural que a primeira experiência dos usuários com BIM seja na fase de concepção e modelagem.
Como vem sendo ressaltado nos artigos do Drops de Conhecimento BIM, a capacitação da equipe é um ponto fundamental para o sucesso da implantação da metodologia nos órgãos e nas empresas. Isso porque trata-se de uma tecnologia que exige uma nova forma de pensar e agir. Outro ponto que merece atenção é a capacidade de processamento das máquinas, já que modelos BIM podem ser pesados, variando de acordo com seu nível de detalhamento.
Ainda que na fase dos primeiros contatos, paralelamente, algumas instituições públicas iniciaram seus trabalhos com a criação de fóruns e grupos de discussão sobre a logística para adoção da BIM. Inclusive, dialogando com órgãos de outros estados. Ao mesmo tempo, também são realizados treinamentos, capacitações e aproximações com diferentes fornecedores de software.
Em Santa Catarina, o trabalho de adoção da BIM na gestão pública tem sido puxado pela Coordenadoria de Modelagem da Informação (COMOD), braço da Secretaria de Estado da Infraestrutura e Mobilidade (SIE). “Desde 2014, Santa Catarina assumiu o pioneirismo na questão, porque houve a criação do Laboratório de BIM (LABIM). E de um grupo de trabalho a fim de começar a desenvolver alguns materiais de especificação técnica: caderno BIM, caderno de encargos etc.” relembra Lauren Cristhine Dias Salla, Coordenadora de Modelagem da Informação na SIE-SC.
Uso da BIM na gestão pública: a experiência na Coordenadoria de Modelagem da Informação da SIE-SC
Após algumas reformas administrativas em 2019, a SIE absorveu o LABIM e autarquias que contavam com parte do corpo de engenheiros do estado. Desde então, a Secretaria, através da COMOD, assumiu a missão de organizar os passos para concluir a implementação da BIM no órgão. Ao contrário de algumas experiências observadas na administração pública brasileira, a COMOD optou por iniciar o processo com a capacitação na parte metodológica para, depois, definir os usos práticos em cada setor.
“A tecnologia chegou antes da metodologia. Nesse cenário, é comum escutar sobre como funciona determinado software que faz x, y, z. Você acha legal, mas, na prática, se pergunta: ‘como vou implementar isso no meu órgão?’ Nosso papel na SIE é realmente dar suporte para que as equipes entendam como funcionaria a aplicação dessa metodologia.” explica Lauren.
Para isso, o grupo inicial montado pela COMOD para participar da capacitação foi composto por pessoas de várias gerências. Elas são peças-chave na parte de coordenação, elaboração e fiscalização de projeto. A primeira capacitação abordou temas macro da teoria da BIM, mas, atualmente, avançou para um curso mais prático. “Ele está sendo ministrado para um grupo macro. Dentro dele, pegamos algumas pessoas que vão fazer o mapeamento do fluxo de processo atual e, posteriormente, o fluxo de trabalho em BIM”.
Dessa forma, a COMOD vai direcionando seu grupo de trabalho para a criação do Plano de Execução BIM (PEBIM), de um BIM Mandate e a atualização do caderno de encargos e de especificação. “Isso tudo vamos precisar construir juntos. Não é um papel só da COMOD, porque vai envolver as outras pessoas que trabalham diretamente com fiscalização e elaboração de projeto” reflete Lauren.
O estudo de caso do CRAS de Biguaçu e a redução de aditivos
Em maio de 2021, a SIE tinha duas licitações de projeto em BIM em aberto, e se encaminhava para a terceira. Até aquele momento, a única experiência de uso de BIM havia sido no contrato para construção do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da cidade de Biguaçu. Inicialmente licitado em CAD, o projeto foi transcrito para BIM pelo LABIM.
A obra virou um estudo de caso do Laboratório e é um bom exemplo de como o uso da BIM traz mais eficiência para os contratos de obras públicas, especialmente quando se fala em aditivos. Lauren conta que havia um aditivo alto das obras por erro de projeto e, consequentemente, de orçamento. Na época do projeto, o LABIM buscou parcerias com algumas empresas desenvolvedoras de softwares para que fizessem a modelagem dos complementares do projeto do CRAS.
“O orçamento dessas obras costumava ter 25%, 24,98% de aditivo, que é o limite de aditivo para obra nova segundo a lei. E sempre chegava a quase 25%” conta Lauren. No edital da licitação, foi colocada, então, uma cláusula explicitando que o aditivo só seria aceito se a empresa contratada mostrasse o erro no modelo BIM. “Não era simplesmente chegar dizendo que faltou tijolo. Como faltou tijolo? A quantidade é X. Se você diz que tem Y, então me mostra o erro no modelo”.
No final, o projeto do CRAS de Biguaçu teve aproximadamente 5% de aditivo, baixando significativamente em relação a experiências anteriores. Na etapa de fiscalização, o órgão seguiu utilizando seu software de gestão de contratos de obras públicas para fazer as medições de forma eficiente. Apenas algumas ações pontuais de fiscalização usaram, de fato, BIM, através de equipamentos emprestados pelo LABIM.
Softplayers participam da adoção da BIM na SIE-SC
“Conseguimos comparar, por exemplo, a planta do projeto com a da nuvem de pontos e verificar que um banheiro, que o projeto determinava que deveria ser acessível, tinha deixado de ser acessível por conta de 10 centímetros. Geramos um relatório com os dados extraídos e conseguimos mostrar para empresa que aquilo precisaria ser arrumado” complementa Flavia Kuhnen Manica, analista de serviços de TI.
Flavia é atualmente uma das softplayers residentes na SIE e integra as ações de capacitação coordenadas por Lauren na frente de implementação da BIM. Junto dela, trabalha João Pedro Alves de Lima, assistente de suporte. Ele também é um funcionário da Softplan que trabalha na Secretaria e, assim como Flávia, dá suporte às tecnologias da empresa utilizadas pelo órgão.
João também tem acompanhado o processo de adoção e estudado sobre a BIM junto da equipe da SIE. “Resumidamente, a BIM nos fornece insumos na forma de dados para que possamos gerir com eficiência um ativo, no caso, um bem público. No entanto, é importante ressaltarmos que esses dados devem ser tratados e organizados, como em qualquer banco de dados, para serem insumos eficientes” analisa João. A Softplan, assim como nossos clientes e softplayers, acompanha as mudanças que a adoção da BIM tem trazido e seguirá trazendo para a área de contratos de obras públicas.
Este artigo é o terceiro conteúdo da série Drops de Conhecimento BIM na gestão pública. No primeiro deles, trouxemos o especialista Washington Lüke para explicar o que é BIM e quais desafios sua adoção trará para as instituições. Na sequência, falamos sobre os impactos da BIM em contratos de obras públicas. Leia a série completa e fique por dentro das mudanças que a metodologia pode trazer para a sua instituição.
Washington Lüke é Coordenador-executivo da Frente Parlamentar BIM, relator do GT BIM INFRA da CEE-134 da ABNT, Diretor Acadêmico do Master BIM INFRA da ZIGURAT e Diretor de Empreendimentos da VALEC S.A.