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Insights

A Tipografia Jurídica como aliada da comunicação no Ministério Público

Júlio Xavier
7 de janeiro de 2025 Tempo: 6 minutos
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O que é Tipografia Jurídica e qual a sua relação com a comunicação? A comunicação é composta não apenas da mensagem, mas também da sua forma ou veículo. Como exemplo temos que um bom orador não é alguém apenas com algo interessante a falar, mas, principalmente, alguém que domina todos os aspectos da comunicação oral: timbre, entonação, dinâmica, pausas e até mesmo a linguagem corporal.

A mesma lógica se aplica à mensagem escrita e é justamente disso que cuida a Tipografia, que, na precisa definição de Ellen Lupton, “é a aparência da linguagem”.

Em um contexto em que a clareza e a precisão são fundamentais para o funcionamento eficiente do sistema de justiça, todos os que nele atuam enfrentam desafios diários relacionados à comunicação de suas demandas.

O excesso de demandas no Judiciário brasileiro – são mais de 80 milhões de processos em tramitação segundo dados oficiais do CNJ – compromete a capacidade de análise detalhada e aprofundada por parte dos magistrados.

No caso do Ministério Público, denúncias, pareceres e outras manifestações processuais precisam equilibrar densidade técnica com acessibilidade cognitiva ou correm o risco de serem incompreendidas.

Nesse cenário, a Tipografia Jurídica emerge como uma ferramenta capaz de otimizar a transferência de conteúdo jurídico e, consequentemente, fortalecer a atuação do Ministério Público.

O documento jurídico como interface

Documentos jurídicos são interfaces que atuam como pontes e conectam o operador do direito, seu conhecimento dos fatos e sua tese ao magistrado, que nada sabe sobre o caso.

E se a mensagem, como vimos, é conteúdo mais forma, a interface cuida justamente dessa última parte. Para mantermos o exemplo da oratória, podemos pensar em um discurso dado a uma plateia através de um microfone de baixa qualidade e alto-falantes ruidosos.

A interface – o meio – prejudica substancialmente a transmissão da mensagem e nela reverbera negativamente, ora gerando incompreensão, ora gerando indisposição à assimilação.

Documentos ilegíveis, ruidosos, prolixos e confusos agem como uma microfonia e podem influenciar negativamente na análise dos fatos pelo magistrado.

A Tipografia Jurídica, enquanto disciplina, se propõe a ir além da aparência estética, integrando conceitos de ergonomia visual, ciência cognitiva e design da informação para criar documentos claros, bem organizados e capazes de proporcionar conforto cognitivo ao leitor.

No caso do MP, que tem como princípio essencial a busca pela justiça, documentos bem estruturados garantem maior assertividade na comunicação e reduzem riscos de interpretações equivocadas.

Os maiores problemas em petições atualmente

O levantamento de dados realizado pelo grupo de pesquisas Visulaw com a magistratura federal em 2020 e estadual em 2021, com mais de 600 juízes, coordenado por Bernardo de Azevedo, constatou que, para os juízes, os principais problemas nas petições são:

Argumentação genérica73,40%
Número excessivo de páginas73,00%
Redação prolixa71,60%
Transcrição excessiva de jurisprudências54,30%
Má formatação da peça31,60%
Uso excessivo de destaques no texto28,40%

Ao longo da pesquisa é revelado o anseio da magistratura por petições mais claras e bem estruturadas, demonstrando que em seu dia a dia enfrenta desafios com a concatenação de ideias e o abuso de destaques.

Tais problemas estão ligados à redação jurídica, à curadoria da informação, mas também à ergonomia visual e qualidade de formatação.

Mas há ainda outro problema quando se trata de órgãos públicos de grande tamanho e relevância, que é a total falta de identidade e padronização.

Identidade padronização e comunicação institucional

Hoje, a maioria dos órgãos públicos buscam ter uma marca forte e presente na sociedade, investindo em branding e marketing institucional com sites, campanhas, redes sociais, etc.

No entanto, quando se trata de documentos, não há coesão. Cada peça é feita de um jeito, sem padronização e, pior, muitas vezes indo de encontro ao manual da marca e a boas práticas de tipografia e design.

Criar e padronizar uma identidade visual também em documentos é essencial para consolidar a imagem institucional e reforçar a credibilidade de qualquer organização, incluindo o Ministério Público.

Petições que se encontram alinhadas à comunicação visual institucional garantem uma apresentação consistente, facilitam a identificação pelo público e promovem a confiança nos atos administrativos e jurídicos.

A uniformidade em elementos como cabeçalhos, rodapés, fontes e espaçamentos cria um padrão que não apenas facilita a leitura, mas também comunica profissionalismo e atenção aos detalhes.

Não menos importante, a padronização contribui para a eficiência operacional, reduzindo o tempo gasto com ajustes e formatações inadequadas.

Quando todos os documentos seguem diretrizes claras e padronizadas, os membros e servidores do MP podem concentrar seus esforços no conteúdo e na qualidade da argumentação jurídica, ao invés de questões de formatação.

Essa abordagem também reforça a percepção de organização e modernidade, valores que são cruciais para uma instituição que busca defender o interesse público de maneira eficiente e acessível.

Tipografia Jurídica na prática: estudo de caso

A aplicação da Tipografia Jurídica em documentos institucionais do MP traz uma série de benefícios práticos, como podemos observar nestes exemplos*

Clareza e Eficiência: documentos ergonômicos e bem formatados são mais claros e reduzem o tempo de leitura e análise, otimizando o trabalho de magistrados e servidores.

Fortalecimento da Argumentação: apresentações visuais bem estruturadas, como tabelas e gráficos, tornam os argumentos mais claros e convincentes.

Resumos Iniciais: apresentações sintéticas dos principais pontos do documento ajudam a destacar as teses centrais e orientar o leitor em uma compreensão rápida e inequívoca acerca dos pontos-chave.

Hierarquia Textual: subtítulos descritivos e espaçamentos bem definidos criam um fluxo de leitura que favorece a localização rápida de conteúdo relevante, além de antecipar a tese central de cada tópico, destacando-a.

Padronização e credibilidade institucional: seguir um padrão visual definido melhora a comunicação e a identificação institucional, reforçando a confiança do público no órgão e aumentando a sua presença de marca.

Em um sistema jurídico cada vez mais dinâmico e sobrecarregado, a Tipografia Jurídica desponta como uma solução concreta para melhorar a eficiência, a comunicação e a credibilidade dos documentos elaborados pelo Ministério Público.

Ao adotar boas práticas de formatação e organização textual, o MP não apenas fortalece sua atuação na defesa do interesse público, mas também reafirma seu compromisso com a justiça, a transparência e a inclusão.

Investir na formação e disseminação dessas técnicas entre membros e servidores é um passo essencial para que o Ministério Público alcance maior eficiência e impacto em sua atuação.

Isso porque a Tipografia Jurídica não é apenas uma ferramenta técnica, mas um instrumento que conecta conteúdo e forma para transformar documentos em poderosos aliados da comunicação institucional.

Referência: LUPTON, Ellen. Pensar com tipos: guia para designers, escritores, editores e estudantes. Título original: Thinking with type: a critical guilde for designers, writers, editors & students. Tradução: André Stolarski. 2ª Edição. Editora Cosac Naify, 2009.

*Os nomes e números de documentos apresentados nas imagens são fictícios e meramente ilustrativos.

É Bacharel em direito e pós-graduado em direito da administração pública pela Universidade Federal Fluminense. Júlio é assessor na Justiça Federal do Rio de Janeiro há doze anos. É especialista em tipografia e formatação de documentos Jurídicos, desenvolveu a disciplina e método Tipografia Jurídica, que une conceitos da ergonomia visual e da ciência cognitiva aplicados a documentos jurídicos. Também é professor e consultor em projetos de identidade tipográfica.

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